Para o consultor inglês Marcus Buckinhgham, é possível desenvolver aquilo que distingue uma boa ideia e um negócio genial: basta encontrar uma área na qual você seja insuperável
O foco nos pontos fortes de um empreendedor pode ser o maior diferencial na construção de uma trajetória de sucesso. Essa é a teoria defendida por Marcus Buckingham, um dos gurus de negócios mais requisitados pelo mercado americano. Autor de best-sellers como Descubra Seus Pontos Fortes e do recém-lançado Quebre Todas as Regras, ele explica nesta entrevista exclusiva para Pequenas Empresas & Grandes Negócios como converter habilidades pessoais em espírito de liderança e engajamento dos consumidores. Para o consultor, que esteve em São Paulo em novembro para participar da HSM ExpoManagement, o segredo é saber comunicar-se com clareza e guiar os demais em direção a um objetivo comum.
Quais são as principais características que um líder deve reunir?
O líder genuíno é alguém que guia pessoas para a construção de um futuro melhor e procura novos caminhos para resolver problemas. São indivíduos que sabem transformar o medo do desconhecido em autoconfiança, convertendo ansiedade em entusiasmo. Pouquíssimas pessoas são excelentes nesse sentido. Grandes líderes são mais vívidos e precisos em suas narrativas. Com isso, conseguem descrever com clareza o que vem pela frente e, desse modo, engajar todos ao seu redor para construir um futuro idealizado.
Como desenvolver essas habilidades?
Determinar o perfil de seu público é um bom começo. Steve Jobs foi um líder falho em muitos sentidos, mas tinha uma visão muito clara do propósito dos produtos da Apple. Outra questão é saber identificar qual é a força competitiva que diferencia a sua empresa das demais, em resultados mensuráveis. Hoje em dia é possível obter métricas de qualquer setor com extrema facilidade. Essas métricas devem estar sintonizadas com as necessidades de consumidores, e a partir daí, ser convertidas em medidas de ação para transformar novos conceitos em realidade. Não existem respostas pré-determinadas para a solução de problemas, as as suas ideias devem ser comunicadas de forma objetiva. Durante a campanha para a prefeitura de Nova York, Rudolph Giuliani estabeleceu alguns pontos-chaves de ação: acabar com os flanelinhas, uniformizar os taxistas e acabar com a pichação. Embora existisse um planejamento muito maior, havia três metas palpáveis e, assim, as pessoas sabiam o que esperar desse líder.
Em livros e palestras, você fala sobre a importância de priorizar o desenvolvimento de pontos fortes. Como cultivar essa mentalidade?
Os melhores empreendedores têm foco em procurar e explorar vantagens competitivas, em encontrar nichos. Eles sabem que sempre existe alguém melhor em cada área – se encontrarem aquela coisa na qual são absolutamente melhores, ganharão uma vantagem enorme. É essencial encontrar uma área na qual você seja insuperável. Vamos fazer uma analogia com o futebol, utilizando o exemplo do Barcelona, vencedor da última Liga dos Campeões e considerado o melhor clube do mundo. Eles têm um elenco de jogadores de baixa estatura. Se você pensar logicamente, todo time precisa de uma equipe equilibrada fisicamente. Mas, em vez de se preocupar com isso, o técnico do Barcelona apostou em explorar as suas vantagens ao máximo, potencializando a agilidade e a habilidade de jogadores mais baixos em um esquema tático que prioriza o passe rápido.
Quando se trabalha apenas os pontos fortes, não existe o perigo de entrar numa zona de conforto e deixar eventuais deficiências ainda mais críticas?
Você não pode ignorar as suas fraquezas, mas isso é diferente de focar nelas. Continuando na analogia com o futebol, vamos pensar sobre o que um clube deve fazer com o seu dinheiro. Quais são as contratações que podem melhorar o time? No exemplo do Barcelona, o técnico não deve ignorar o fato de seus jogadores terem baixa estatura, mas esse ponto fraco deve ser trabalhado apenas o suficiente para não atrapalhar o sucesso do time. Ele pode escalar um zagueiro e um volante mais fortes fisicamente. A pergunta a ser feita é: de onde virá o maior retorno? É uma questão de retorno do investimento. Você não precisa ser bom em tudo, mas ser o melhor naquilo em que se destaca. É isso que torna uma empresa imbatível.
O que os melhores empreendedores fazem de diferente?
Eles conseguem identificar os pontos em que são mais fortes do que os concorrentes. É preciso encontrar suas forças e cultivá-las de uma forma única. A Apple nunca manifestou interesse por qualquer plataforma social. O mundo pede isso atualmente? Com certeza. Mas eles estavam tão evoluídos no que faziam de melhor que isso não impediu o sucesso de seus produtos.
É possível atingir um nível de excelência atuando em uma área com a qual você não tem uma afinidade especial?
Você consegue desenvolver isso até certo ponto, mas nunca a um grau máximo de excelência. Essas competências são atingidas dentro de contextos específicos e, por isso, não são completamente transferíveis. Um caso clássico no mercado americano é a trajetória profissional de Bob Nardelli. Ele era um dos grandes executivos da GE, apontado como o provável sucessor de Jack Welch. Em 2004, foi chamado para comandar a Home Depot. Sua gestão como CEO foi marcada por três péssimos anos, que culminaram em sua demissão. Era óbvio que ele não gostava do mundo do varejo. É um cara inteligente? Sim. É um grande líder? Com certeza. Mas, para chegar a um nível de excelência, é necessário estar inserido em um contexto ideal – e ele não estava. É fundamental ser apaixonado pelo que faz para engajar equipes e consumidores. Um executivo não pode ser o presidente de uma empresa de chocolates e não amar o cheiro de chocolate. Para o empreendedor, esse aspecto é ainda mais crítico. Se você não acredita no seu produto, como vai convencer as pessoas a acreditar nele? Autenticidade é tudo.
Muitas empresas alimentam a cultura de que todos devem ser líderes dentro da organização. O que você pensa disso?
Se todos são líderes, ninguém realmente lidera. O conceito perde o sentido. Quando falamos de colaboradores, é mais importante que sejam inovadores e engajados do que propriamente líderes. Empresas devem estimular iniciativa, ambição e propósito. Mas liderança é outra coisa: tem a ver com guiar as pessoas em direção a um objetivo compartilhado. Grandes líderes são otimistas naturais: acreditam que podem mudar o mundo. Isso é algo bastante difícil de ser cultivado. Afinal de contas, como todo empreendedor sabe, a possibilidade de tudo dar errado é sempre muito maior.
No livro Quebre Todas as Regras, você fala sobre a necessidade de encorajar um espírito questionador nas empresas. Como estabelecer uma cultura de criatividade e inovação de forma não conflitante com os processos corporativos? Quando é a hora de quebrar uma regra?
É necessário se perguntar qual é o ingrediente indispensável para se construir um negócio. Dinheiro? Ideias? Mercado? Apenas os bem-sucedidos entendem que existe apenas uma resposta para essa questão: o consumidor. Se você não tem um público, não tem um negócio. Se ninguém quer comprar o seu produto, significa que não é um bom produto. As regras que você deve quebrar são as que impedem que você atenda melhor as demandas dos seus consumidores. A derrubada de paradigmas não deve ser orientada pela rebeldia, mas por uma necessidade.
Talento ou eficiência: o que vale mais para uma empresa?
Talento, sempre. É algo multiplicável. Quanto mais você investe em talento, mais resultados consegue. Eficiência é estática. Talento está ligado a engajamento. Deve-se concentrar no que motiva e inspira as pessoas, em vez de simplesmente analisar o nível de eficiência com que atuam em certo momento. Claro que esse talento precisa ser gerenciado e canalizado. A melhor forma de fazer isso é deixar claro para o colaborador exatamente o que você espera dele e de suas habilidades.
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